Diante das pluridimensões e suas interações na atualidade, que compõem o universo das relações coletivas, sobretudo quando se coloca à mesa temas da discussão contemporânea, como o da sustentabilidade, desdobrado pelos interesses globais, regionais, locais e pelos efeitos indesejáveis do modelo de desenvolvimento, pensar o lugar do cidadão nas intervenções na realidade coletiva, mais do que uma tarefa complexa, exige admitir um novo conjunto de atribuições e até de posicionamento por parte dele.
Como na participação moldada, isto requer uma compreensão sobre participação da sociedade civil organizada próxima à noção de “cidadania ativa”, que passa a significar não simplesmente participação em políticas e instituições sociais já dadas – sejam instituições política, do trabalho, familiares ou educacionais – e tem como objetivo identificar nos campos da esfera pública, das políticas públicas e da Teoria da Complexidade elementos contributivos que levem as políticas públicas a reconsiderar o cidadão como ator principal, verificando evidências de sua utilização em linhas estratégicas municipais.
Parece haver uma diferença de interesses entre os homens e as organizações, quando a dimensão econômica toma a frente apoiada na tecnocracia e determina os rumos para o progresso. Vinculados a isso estão diversos efeitos nocivos, como os problemas de exaustão de recursos naturais, alterações ambientais e exclusão social, que interferem na condição de prosseguimento da sobrevivência no planeta. Cabe, pois, ao cidadão exercitar sua cidadania planetária, no sentido ateniense do termo, em que a cidadania é o direito da pessoa de participar das decisões nos destinos da cidade, aqui do planeta (reunião dos chamados de dentro para fora), na Ágora (praça pública, onde se discutia para deliberar sobre decisões de comum acordo).
Dentro dessa concepção participativa da democracia grega, pretende-se fazer breve estudo sobre a consideração que as políticas públicas municipais têm dado ao cidadão o direito de responder se é possível que ele deixe de ser apenas objeto e passe a ser sujeito – papel que parece ser necessário e imprescindível para enfrentar temas como a sustentabilidade e questionar os benefícios do modelo atual de desenvolvimento. A partir da discussão teórica do papel do cidadão, fundamentada na Teoria da Complexidade, o cidadão nas políticas públicas encontra respostas para as soluções coletivas.
Dessa forma, políticas públicas que queiram enfrentar de modo efetivo a questão posta, precisam contemplar a natureza complexa desses sistemas, de características adaptativas, assim como estimular a participação do cidadão nessa nova ótica, pois é a partir dele, de seus anseios e do seu local de moradia que surgem os insumos indispensáveis a serem absorvidos nas políticas, de forma geral, buscamos hoje articular o Estado, o mundo empresarial e a sociedade civil, visando a um desenvolvimento que seja socialmente justo, economicamente viável, e sustentável em termos ambientais.
Nesta visão de articulações sociais, não podemos esquecer que a sociedade civil constitui o objetivo final das nossas atividades: quem terá, ou deixará de ter, qualidade de vida, é a sociedade e as pessoas físicas que a constituem, e não o “Estado” ou uma pessoa jurídica como a “empresa”. O Estado e a empresa, por importantes que sejam, constituem meios. Inclusive, é da participação informada da sociedade que depende em grande parte o bom funcionamento tanto do Estado como das empresas. Nesse sentido, o lugar do cidadão nas políticas públicas é central, tornando-se responsável por orientar o processo e articular, segundo os interesses coletivos, intervindo na realidade social.
Ao longo da história, coube ao Estado administrar as relações públicas, por meio de normas e políticas, firmando os compromissos com base em planos, programas e projetos que precisariam encontrar os interesses e orientar as ações públicas para o desenvolvimento local e do coletivo. Configurou-se, assim, uma simbiose cidadão-Estado de forma equilibrada, com o resgate da vontade popular efetiva, colhida a principio frente a frente, e depois substituída por indicadores e números e, na maioria dos casos, pelo saber técnico.
Essa mudança ajudou a causar alterações decrescentes nos níveis de participação do cidadão no ciclo das políticas públicas, desfigurando assim o lugar de ator principal, a ponto de questionar-se, hoje, se não é uma utopia reconsiderá-lo em seu verdadeiro papel. Para alterar esse letárgico cenário, houve no mundo e em segmentos da sociedade o surgimento impacto. Vale dizer, participação tendo o sentido de que os atores sociais envolvidos possam reconstruir coletivamente e reconfigurar os espaços e instituições dos quais fazem parte.
Em geral, as intervenções na realidade se fazem por políticas públicas, tradução aproximada dos anseios sociais. Anseios que não podem bastar-se nos interesses do homem para evitar traços egoístas, principalmente quando entende que o planeta é a casa do homem e a natureza existe para lhe subsistir politicamente, cientificamente, economicamente – sem colocar de lado a maior parte dos seres, graças à moral, os excluídos se fazem ouvir de novo. Reservar esta virtude somente aos humanos passará rapidamente como o mais imoral dos vícios.
Do que se entende que o lugar do cidadão nas políticas é de defesa de interesses do coletivo, através de participação efetiva na esfera pública, mas com força transformadora a partir do diálogo. Além do anseio social e da discussão, esse espaço de diálogo parece ser local também adequado para a reconciliação, entre os humanos e os não humanos, ou ainda entre a sociedade e a natureza, dissociados pelo progresso econômico e pelo modelo cartesiano. Essa reconciliação exige um vetor responsável, possivelmente o cidadão, e viria em defesa e no estabelecimento de uma organização coletiva que se coloca como resposta à separação atual entre a naturalização, de um lado, e a socialização, do outro. Fator obtido pela coisificação do mundo e que sem dúvida ajuda a contribuir com os passivos ambientais ainda não resolvidos, no específico, e no geral vai de forma contrária ao fluxo rumo a um caráter civilizatório, já que ao ignorar as Assembleias representativas nas quais os interesses dos não humanos são defendidos, está-se optando pela barbárie.
Em um dos princípios para entender a complexidade, pode-se entender que “a sociedade é produzida pelas interações entre indivíduos, mas a sociedade uma vez produzida retroage sobre os indivíduos e os produz”. Nesse sentido, a partir da focalização no ser, no indivíduo e suas necessidades. Também pode apresentar uma subordinação de suas prioridades e práticas às lógicas do poder político, dos capitais privados e ao grau de profissionalização da burocracia estatal, o que pode gerar, em alguns casos, reflexos indesejáveis que as afastam de seu objetivo e da participação democrática. O paradigma cartesiano dominante deu origem a políticas públicas com características unidimensionais, reducionistas e impositivas, em geral desconsiderando o papel do cidadão e suas interações no processo.
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