“Preciso bater minha meta de proteína”. Você provavelmente já deve ter ouvido essa frase vinda de alguém que está fazendo dieta. A preocupação com a ingestão diária adequada dessas macromoléculas tem levado diversas pessoas a buscar alternativas para conseguir cumprir as orientações dos nutricionistas. Nesse grupo, destaca-se o usuário de canetas emagrecedoras, que precisa consumi-las em boa quantidade para não perder massa magra. Todo esse movimento tem ajudado a crescer um mercado relativamente recente, mas muito promissor: o de whey protein (do inglês, proteína de soro de leite), especialmente quando adicionado a produtos prontos.
De acordo com dados da empresa internacional de pesquisas Grand View Research, o mercado de whey protein deve alcançar globalmente US$ 14,3 bilhões em 2030. Para se ter uma ideia, em 2021, foram US$ 5,33 bilhões, ou seja, um crescimento de 168,3%. Segundo a Associação Brasileira de Empresas de Produtos Nutricionais (Abenutri), no Brasil, o setor de suplementos (que inclui saúde, perda de peso, nutrição cosmética e nutrição esportiva) movimenta R$ 30 bilhões anualmente. Quando a associação foi fundada, no ano 2000, havia 19 empresas desse tipo, com faturamento de US$ 360 milhões. Hoje, são mais de 860.
Nos últimos anos, esse nicho atraiu investimentos de diversas empresas - em grande parte, laticínios. A partir da proteína extraída do soro do leite (que pode ser a beta-lactoglobulina e a alfa-lactalbumina), diversos produtos têm sido lançados pela indústria. E tem de tudo: iogurtes, bebidas lácteas UHT, barrinhas de cereal, bolos, brownies, sobremesas e até cerveja. Nessa linha, até as marcas de produtos naturalmente proteicos - ou seja, que não têm whey adicionado - passaram a reforçar a quantidade desses compostos nas embalagens.
Em alguns supermercados, produtos desse tipo ganharam até setor exclusivo, como é o caso do Supernosso, em Belo Horizonte. "O whey continua como líder nas vendas, mas o perfil do consumidor vem mudando: antes restrito a frequentadores de academia, hoje inclui pessoas de diferentes idades interessadas em saúde, emagrecimento, longevidade e estética”, comenta a gerente de marketing do Grupo Supernosso, Tatiana Geraldo.
Outro exemplo da expansão desse setor é que, recentemente, foi anunciada em Barbacena, na Zona da Mata, a chegada da fábrica da Bees-Bee Alimentos LTDA. A empresa vai investir R$ 70 milhões na construção de um espaço dedicado à fabricação da proteína isolada do soro do leite em larga escala. A unidade fabril, de 6.000 m², deverá produzir 800 mil litros por dia, com previsão de chegar a até 2 milhões de litros na capacidade máxima.
A analista do Sebrae Simone Lopes pontua que esse mercado vem crescendo motivado por diversos fatores que estão ligados ao comportamento do consumidor, que busca saúde, bem-estar e longevidade. “As pessoas estão olhando muito para isso, principalmente depois da pandemia. Acho que isso foi uma virada de chave do mercado consumidor”, diz.
Ela acredita que há uma brecha para expansão dos proteicos inclusive para o mercado de food service. “De um lado eu tenho a indústria que está produzindo diretamente para o mercado consumidor, mas eu tenho também a indústria que pode estar produzindo para os operadores de food service, que são os bares, as cafeterias, os restaurantes e que já olham para isso também nos seus cardápios”, diz. “É uma oportunidade muito grande”, acredita.
Canetas emagrecedoras podem ter impulsionado setor
Na visão de agentes do setor, o advento das canetas emagrecedoras pode ser um dos fatores que estão influenciando o crescimento da demanda por produtos com alta concentração proteica. Isso porque as pessoas que usam esses medicamentos precisam passar por reeducação alimentar.
Para a nutróloga Eliana Teixeira, especialista em emagrecimento, menopausa e saúde da mulher, com a crescente popularidade desses medicamentos, as pessoas estão se tornando mais conscientes da importância de manter a massa muscular durante o processo de perda de peso. “Isso pode estar impulsionando a demanda por alimentos proteicos e suplementos que ajudem a apoiar a saúde muscular”, comenta.
Essa é também a percepção do CEO da Trevo Lácteos, Guilherme Gama. “Na hora que o corpo não encontra proteína, em vez de queimar gordura, ele vai ‘queimar’ o músculo. Então, a pessoa perde massa magra”, analisa Guilherme. “A categoria de proteinados vem crescendo muito, principalmente nos dois últimos anos, em uma faixa de mais de 70% ao ano. Especialmente em duas categorias: linha de iogurtes e linha de bebidas lácteas”, comenta Guilherme.
Em Minas Gerais, a Trevo Lácteos tem investido bastante nesse nicho. Recentemente, em parceria com a alemã Ehrmann (que controla a empresa desde 2022), a marca introduziu no mercado uma linha de produtos proteicos, especialmente iogurtes em garrafinhas e pouches (embalagens que podem ficar fora da geladeira por cerca de 5 horas) e bebidas lácteas (em embalagem com tecnologia UHT, que não precisa de refrigeração).
A empresa deve trazer em breve outras opções de produtos para atender a demanda. “Nós estamos trazendo várias novidades a partir do começo do ano que vem, direto da Alemanha, todos focados nessa linha de proteína”, anuncia. E o foco é na indulgência. “São produtos que vão ter alto teor proteico, baixo teor de gordura, zero açúcar, mas que vão te dar uma grande saciedade e matar aquela vontade de comer um doce, uma sobremesa. Isso é o que as pessoas mais têm reclamado e sentido falta”, diz.
A empresa investiu nos últimos 18 meses cerca de R$ 100 milhões na capacidade fabril, já pensando na chegada desses produtos. Atualmente a Trevo Lácteos conta com cinco sabores de bebidas em garrafinha de 250g, quatro de pouches e quatro de copos. A empresa deve anunciar ainda mais quatro lançamentos este ano - um deles é o sabor pistache nas linhas de garrafinha e pouches.
A gerente nacional de vendas da Porto Alegre, Anna Carneiro, também cita a influência das canetas emagrecedoras. “Como esse tipo de tratamento exige ingestão adequada de proteínas para preservar massa magra durante a perda de peso, a demanda por esses alimentos só tende a crescer”, avalia.
A Porto Alegre lançou, no ano passado, uma linha de bebidas UHT, nos sabores chocolate e baunilha, e a versão iogurte, sabor morango e banana. Em outubro, a marca prevê o lançamento do whey UHT sabor café expresso. “Antes restrito a atletas e praticantes de atividades físicas, hoje [o alimento proteico] atinge um público muito mais amplo, que busca saúde, bem-estar e qualidade de vida no dia a dia”, comenta Anna. “Há uma maior conscientização sobre a importância das proteínas, não apenas por estética, mas pela manutenção da saúde muscular, óssea e metabólica”, diz.
Público diverso
Já a gerente de Marketing da Alvoar Lácteos, Barbara Florêncio, cita que esse mercado está atraindo um público muito diverso. “A gente está entusiasmado com esse momento, principalmente porque está em várias faixas etárias, são pessoas que não estão só buscando performance”, diz.
A Alvoar Lácteos aposta na marca YoBem. A empresa chegou a Minas Gerais há cerca de um ano e meio e tem uma linha de produtos proteicos com quatro sabores diferentes. Estão previstos para o ano que vem investimentos em sobremesas e produtos inovadores, pensando em novas ocasiões de consumo. Minas é o quarto estado em volume de vendas na empresa, que cresceu cerca de 300% desde o primeiro mês em solo mineiro.
Já a head de Nutrição, Saúde e Bem-Estar da Nestlé Brasil, Gisele Pavin, reforça que o consumo de produtos proteicos deixou de ser restrito a atletas e frequentadores de academias, passando a incluir pessoas preocupadas com saúde, idosos, mulheres na menopausa e praticantes de atividades físicas moderadas. “Essa tendência já é uma realidade em diferentes categorias, especialmente em suplementos em pó e líquidos, suplementos esportivos, além de outros formatos”, diz.
Até o ano passado, os investimentos da empresa estavam voltados para os produtos da linha Nutren: protein, mulher, senior, control, active. Já neste ano, a empresa expandiu para outras linhas: Nescafé ProEnergy e Aveia proteinada. Segundo Gisele, a tendência dos proteicos tem influenciado de maneira significativa as decisões de portfólio e inovação nos produtos da Nestlé.
“Nos últimos 12 meses lançamos outras duas versões da marca no formato pronto para beber, com 20g de proteínas mais cafeína ou com 15g e zero lactose, além do novo Nescafé Pró Energy, também com 15g, 100mg de cafeína e 3g de TCM, e mais recentemente a Aveia com Proteína”, exemplifica Gisele.
Alimentos sólidos também se destacam nesse universo
Quem cresceu de forma exponencial após enxergar um nicho de mercado e investir em marketing foi a Bold Snacks. A marca mineira de proteicos cresceu 63.000% desde a sua inauguração, em 2018. E o foco são os alimentos sólidos: barras de cereal, wafer e whey. São 30 produtos no portfólio.
De acordo com o fundador e CEO da Bold, Gabriel Ferreira, a empresa prevê um investimento de R$ 10 milhões na expansão e construção de um centro de distribuição. O espaço ficará no complexo da fábrica localizada em Divinópolis, no Centro-Oeste de Minas - unidade que recebeu R$ 35 milhões de investimento na ocasião da construção.
Gabriel diz que a proposta do produto da empresa está em um reequilíbrio dos alimentos industrializados. “Dos três macronutrientes essenciais para a vida - carboidratos, proteínas e gorduras - o mais importante quando a gente fala para a longevidade é a proteína”, diz. “Os industrializados eram todos alimentos ricos em carboidrato e gordura. Se a gente olha para um chocolate ou um biscoito, são muitas calorias vazias”, diz.
“Então, quando a gente adiciona a proteína nesses alimentos, como é o caso das barras, nada mais é do que a gente reequilibrar aqueles alimentos”, argumenta. “ Isso era algo que antes ficava muito só no mundo ali das pessoas que faziam academia, mas as pessoas têm entendido que é para todas as fases da vida”, diz.
A ideia da Bold surgiu após a percepção de que, no Brasil, havia poucas opções de barras de proteínas que fossem saborosas e com uma boa tabela nutricional ao mesmo tempo. No início, a empresa começou com suplementos, mas, após entender o mercado, apostou nos alimentos que oferecem um conforto emocional. “Eu vi que existia uma oportunidade para trazer um posicionamento diferente, para fazer a barra de proteína de uma maneira diferente, associando um pouco mais aos doces, à indulgência, que era tudo que as pessoas gostavam de consumir”, diz Gabriel.
Em outubro, está previsto o lançamento de um novo sabor de barrinha: doce de leite. Além disso, a empresa, já consolidada, está retomando a venda de whey em pó. “Antigamente as pessoas só tomavam whey com água, na coqueteleira. Hoje já existem várias outras formas de consumir, seja colocando no iogurte, em frutas, em receitas. É por isso que a gente resolveu voltar para a categoria da proteína em pó”, afirma.
Proteína vegetal surfa nesse mercado
Dentro desse cenário, o público vegano ou que tem alguma restrição alimentar, como alergia à proteína do leite, acaba ficando com poucas alternativas. Pensando nesse consumidor, a marca de alimentos saudáveis Belive lançou uma linha de produtos com proteína 100% vegetal.
Criada em 2015, a empresa produz alimentos livres de glúten e de leite/lactose e tem um extenso portfólio sem açúcar e opções também proteicas. “O primeiro snack proteico que lançamos foi o Brownie de Chocolate Protein, sem glúten e sem leite/lactose e com 5g de proteínas de fonte vegetal”, comenta o CEO da Belive, Samuel Ma. “Entramos nesse mercado observando o aumento da demanda por opções além dos suplementos, e inovamos trazendo um produto usando proteínas de origem vegetal (como soja e ervilha), para ser uma alternativa àqueles que não podem ou preferem não consumir leite”, conta.
Com o sucesso das vendas, depois vieram a versão zero adição de açúcar e outros sabores, como Brownie de Cappuccino e Brownie de Avelã, e também um Pão de Mel Protein, coberto de chocolate - são cinco produtos proteicos ao todo, quatro brownies e um pão de mel. “Já temos um lançamento proteico programado para breve, diferente dos atuais da linha, com ótimas expectativas”, revela Samuel Ma.
O executivo acredita que esse mercado é promissor. “Com a facilidade de acesso à informação hoje, cada vez mais as pessoas têm se conscientizado da importância do consumo de proteínas em uma dieta culturalmente baseada em carboidratos em todas as refeições”, analisa.
Marcas reforçam presença natural de proteínas nos produtos
Além dos produtos com whey adicionado, o “hype” desse mercado permite ainda estratégias de marketing de empresas que produzem alimentos naturalmente proteicos. Esse inclusive é o mote de uma campanha publicitária da Mantiqueira Brasil. O ovo de galinha, por si só, já é um alimento rico em proteína. E a estratégia da marca é reforçar isso.
De acordo com a empresa, o objetivo da campanha é “consolidar a marca como ‘top of mind’ no Brasil, reforçando sua liderança no segmento e destacando o ovo como um alimento naturalmente proteico, acessível, versátil e de alto valor biológico”. A Mantiqueira trabalha com as linhas Jumbo e Extra - a cada duas unidades, o Ovo Jumbo oferece 15g de proteína, enquanto a versão Extra entrega 13g.
Nesse sentido, a Seara também apostou em um novo produto, reforçando a quantidade de proteína presente no alimento. A empresa lançou recentemente o “bolovo”, um bolinho de carne recheado com ovo - item muito comum no cardápio de bares, inclusive. Em comercial protagonizado pela apresentadora Sabrina Sato, a marca reforça que o bolinho, feito para esquentar na Air Fryer, tem 34g de proteína - naturalmente encontrada no ovo e na carne bovina.
Especialistas pedem, porém, cautela no consumo de ultraprocessados
Apesar da proposta positiva de auxiliar a população a bater a meta proteica diária, muitos produtos prontos para consumo se enquadram na categoria de ultraprocessados. Esse aspecto acende alerta de especialistas na área, que pedem cautela no consumo desses alimentos. Entidades como a Organização Mundial da Saúde sugerem que a ingestão exagerada e prolongada de ultraprocessados pode estar ligada ao desenvolvimento de diversas doenças.
Inclusive, um estudo liderado por pesquisadores da USP e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) relaciona o consumo de ultraprocessados à morte precoce. A partir de dados de consumo alimentar em oito países, a pesquisa, publicada na revista científica American Journal of Preventive Medicine em maio deste ano, mostra que a cada 10% de aumento da ingestão de alimentos ultraprocessados, o risco de morte prematura sobe 3%.
A pesquisadora e doutoranda da UFMG Marcelle Saldanha, que estuda a associação de ultraprocessados em indivíduos com declínio cognitivo, lembra que existem graus de processamento diferentes. E as bebidas proteicas, geralmente, se enquadram no grupo de alto grau de processamento.
“Eu desconheço algum produto desses proteicos que não seja ultraprocessado”, diz. Ela lembra que são alimentos com muitos compostos adicionados. “Eles precisam colocar aditivo para que fique palatável, porque a proteína tem um gosto residual. Então, se não for alimento altamente palatável, o que também é uma das características dos ultraprocessados, esse alimento não vai vender”, resume.
A nutróloga Eliana Teixeira lembra que iogurtes proteicos, barrinhas e whey protein podem ser práticos, mas muitos deles trazem aditivos, espessantes e adoçantes artificiais. “A recomendação é que sejam usados de forma estratégica e eventual, especialmente em situações de conveniência, como uma rotina corrida em que não se consegue preparar uma refeição completa”, orienta.
Segundo a médica, o ideal é priorizar as fontes naturais, como ovos, peixes, carnes, queijos de boa qualidade e leguminosas. “O consumo exagerado de ultraprocessados, mesmo os proteicos, pode sobrecarregar o organismo e não substituir a riqueza nutricional dos alimentos in natura”, alerta. “O ideal é distribuir a ingestão ao longo do dia, evitando concentrá-la em uma única refeição. Isso favorece a absorção e o estímulo constante da síntese proteica, fundamental para a manutenção da massa muscular”, explica.
Por O Tempo
Sete Lagoas Notícias
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