A vida é muito para ser insignificante. Foi nisso que acreditei durante os cinco meses que se passaram desde o fim do meu noivado. Pensando assim que consegui me levantar a cada novo dia, deixando de sobreviver para finalmente viver.
Maio chegou, enfim, o mês mais esperado para se casar. Um mês florido, com temperaturas agradáveis, totalmente favorável. Apesar do meu esforço em deixar para trás o passado, sabia que, em algum momento ele voltaria para me assombrar. A carga emocional me fez regredir da minha tão recente evolução.
Em segredo, fiz um perfil falso em uma rede social com a intenção de acompanhar a rotina de Rodrigo desse dia até o dia do casamento. O que eu queria mesmo era saber se ainda havia restado algum sentimento. À medida que esse dia se aproximava, meus amigos se organizaram e fizeram um “plano de fuga” para que eu me ausentasse da cidade.
Apesar de não ter tido sucesso em minha investigação, o mês das noivas me trouxe revelações que fizeram reaparecer alguns fantasmas. Uma colega, que também estudava na mesma faculdade que Rodrigo, resolveu me contar tudo o que ela havia presenciado durante o tempo em que organizávamos o nosso casamento.
Ouvi perplexa seus relatos que confirmavam o que todos tinham certeza, menos eu, a traição de Rodrigo; na verdade, o mais adequado seria dizer traições. Segundo ela, bastaram apenas dois meses desde o início do curso para que ela o visse pela primeira vez atracado com uma garota pelos prédios da faculdade e, desde então, não parou mais. Era uma mulher diferente a cada dia: loiras, ruivas, morenas... um carrossel de cores e de chifres, agora, confirmados por mim.
Não foi necessário um período muito longo para que ele se sentisse confortável nesse novo meio fazendo com que todos os meus medos de tempos atrás se confirmassem.
Pensativa sobre o que acabara de saber, lembrei-me do dia em que o vi passar de carro quando voltava do meu cursinho. Ao chegar em minha casa, disse tê-lo visto. Visivelmente assustado, perguntou-me onde. Acabou se explicando dizendo que levava um amigo de carona todos os dias até o ponto de ônibus. Percebendo que eu não desconfiava de nada, relaxou. Apesar de ter estranhado, não vi motivo para me preocupar, cega que estava devido ao casamento que organizava a todo vapor. Provavelmente o seu incômodo se devia ao fato de estar acompanhado de alguma das suas “peguetes”. Agora ficava fácil compreender porque me beijar ao chegar da faculdade era cada vez mais difícil.
A mãe dessa minha amiga, ouvindo nossa conversa, não concordou com o fato da filha ter me contado o que sabia sobre Rodrigo e, justo no momento em que eu parecia estar me recuperando. Kênia retrucou dizendo não ter contado antes porque seria muito insensível da parte dela interferir na minha felicidade, mesmo que essa não passasse de uma farsa.
Ouvia tudo tentando assimilar o fato de que eu realmente havia sido traída de forma cruel e persistente, sem jamais imaginar que Rodrigo seria capaz de atentar dessa forma contra o nosso relacionamento.
Foi nesse período que a minha ex-sogra reapareceu visivelmente preocupada pela proximidade da data e de tudo o que ela significava para mim. Chegou a se oferecer para passar o dia 24 comigo e com minha mãe. Apesar dessa atitude não mudar em nada o curso dos acontecimentos, parecia uma opção para amenizar o sofrimento que esse dia de certo me traria.
Contei-lhe que não estaria na cidade no final de semana marcado para a cerimônia, ideia aprovada por ela; mesmo assim, insistiu em fazer companhia à minha mãe. A semana que antecedeu a data que aconteceria o casamento foi tensa, desconfortável e angustiante, deixando evidente toda a dor que eu ainda sentia.
No sábado de manhã, à medida que me afastava de tudo que pudesse me lembrar o casamento, observei que o dia havia amanhecido como deveria: perfeito para celebrar o amor! À noite, enquanto me arrumava para sair e tentar esquecer a fatídica data, imaginava, a cada segundo, o que eu estaria fazendo se o meu sonho tivesse se concretizado. Sentia a frustração por cada emoção que pretendia viver e não vivi.
Ao chegarmos ao local escolhido para a grande noitada, a primeira coisa que vi me remeteu exatamente ao que eu estava tentando não me lembrar. Inúmeras noivinhas que escolheram o mesmo lugar para celebrar a alegria de estarem em vias de consumar uma nova fase de suas vidas. Para qualquer lugar que eu olhasse, era possível ver um arco branco, véu e inúmeros sorrisos que atestavam a mesma felicidade que eu havia sentido um dia. Se despediam da vida de solteira, aquela para a qual eu tinha sido obrigada a voltar.
Nesse momento, os meus amigos que até então tentavam agir com naturalidade, me olharam, abraçaram e trouxeram conforto diante de uma situação que a todo custo tentaram evitar.
De volta ao hotel tentei dormir. No silêncio do quarto, pensamentos inquietantes sabotavam a tentativa. Diante disso, resolvi interromper os planos de passar o final de semana longe de casa decidindo retornar. O cuidado dos meus amigos me deixou longe fisicamente, mas não emocionalmente, do conflito interno que estava vivendo.
Já em casa, me arrumei rapidamente a fim de ainda conseguir participar do casamento da minha amiga Josiane, mesmo tendo prometido nunca mais comparecer a um. Não era justo com ela que eu faltasse. O casal fez de tudo para me convencer a ir: visitas, convites a mais para eu levar quem quisesse... Disseram até que estaria isenta de aparecer na igreja, que se contentariam em me encontrarem somente na festa e, assim procedi.
Senti-me estranha e até um pouco atordoada ao chegar à recepção. Ao encontrar-me com a mãe da noiva, ambas nos emocionamos por ter ela participado ativamente das escolhas para a cerimônia do meu casamento. Ver os noivos felizes com a minha presença me manteve firme para aguentar até o final. Fiz o que precisava fazer, enfrentei a minha dor, não poderia continuar usando a mágoa como desculpa para não seguir em frente.
Na volta para casa, minha mãe disse que precisava me contar algo. Sentei ao seu lado prestando atenção no que ela dizia. Sem rodeios, foi logo me contando que Rodrigo iria se casar. Não havia se passado nem um ano, mas poucos meses foram mais que suficientes para ele seguir em frente de uma maneira que eu não esperava.
Levantei-me em silêncio incapaz de absorver o que tinha acabado de ouvir. Sentindo-me novamente abatida e derrotada, revivi toda a decepção e sofrimento do fim mais uma vez. Percebi que o que é enterrado vivo, nunca morre.
Referências:
Peguete: Diz-se daquela pessoa que mantém um relacionamento amaroso e/ou sexual ocasional e sem compromisso.
O que é enterrado vivo nunca morre – Joyce Meyer
ADVERTÊNCIA: As informações expressas nesta coluna podem reproduzir situações reais e são de responsabilidade da autora, embora os personagens usados também possam ser fictícios.