A popularização da internet e o uso massivo das redes sociais resultaram em consequências positivas em inúmeros segmentos da sociedade, mas também fizeram com que o ambiente virtual se tornasse mais um campo de infrações. O suposto anonimato gera a sensação de que se pode publicar ou compartilhar informações falsas, abrindo margem para denigrir a imagem das pessoas.
Mas o delegado Juarez Ferreira, chefe do Departamento de Polícia Civil em Sete Lagoas, parte integrante da 19ª Região Integrada de Segurança Pública (Risp), adverte que tais práticas são consideradas crime e que todos aqueles que compartilham sem ter certeza de que a informação é verdadeira podem ser penalizados.
Em 2018, ano eleitoral, há expectativa de que haja um aumento significativo das ofensas contra os candidatos, especialmente diante do ambiente político conturbado do país. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a Polícia Federal (PF) já anunciaram que vão fechar o cerco contra as fake news.
No início de janeiro, o deputado estadual Douglas Melo foi alvo de notícias falsas nas redes sociais e registrou um boletim de ocorrência (clique e relembre) na Delegacia Especializada de Crimes Cibernéticos, em Belo Horizonte. Na ocasião foram atribuídas a ele, em uma publicação falsa de Contagem, declarações prejudiciais à sua imagem em relação ao seu eleitorado em Sete Lagoas. Em entrevista exclusiva ao SeteLagoasNotícias.com.br, o delegado Juarez Ferreira explica como agir em situações semelhantes e esclarece o atual contexto dos crimes virtuais.
7LN: Quais são os crimes virtuais mais comuns?
Juarez Ferreira: O que nós temos hoje com a utilização massiva das redes sociais, seja nos Facebooks, em blogs, ou nas contas pessoais, aconteceram muitos delitos. Nós temos muitos crimes virtuais, realmente. Os mais comuns são: ameaça do artigo 147 do Código Penal; nós temos o crime de injúria, calúnia e difamação, previstos no Código Penal e, agora, está começando o período eleitoral. O Código Eleitoral também prevê os mesmos delitos, ou seja, calúnia, injúria e difamação. Os mais comuns são esses e pedofilia. E o próprio estelionato virtual, que é a utilização de cartões e tudo mais. Esse é um contexto mais comum que a gente tem encontrado esses crimes aqui.
7LN: O que caracteriza um crime contra a honra?
Juarez Ferreira: Tanto no virtual quando nos outros meios: caluniar uma pessoa é difamar aquela pessoa imputando a ela fatos ofensivos. Vou dar um exemplo, a calúnia, no artigo 137 do Código Penal é imputar a alguém fato definido como crime. É eu virar para a pessoa e dizer: você é traficante, você é ladrão; então esse fato está imputando que a pessoa está cometendo um crime ou que ela comete um crime, o que caracteriza a calúnia. A difamação é quando a coisa ofendeu a reputação da pessoa: você é um mau pagador, você é uma pessoa desonesta. Então há uma diferença um é crime o outro é contra a reputação dela. E a injúria é quando fala você é gay, você é homossexual (em contexto pejorativo, sem que a pessoa seja, com intenção de ofender). Então são mínimas coisas, mas cada um tem uma diferenciação. As penas normalmente são as mesmas, variam de alguns meses há anos, seis meses a dois anos e são julgados em Juizado Especial. Esses são os crimes mais comuns. E o crime de ameaça, que é o artigo 147, que pode ser cometido seja por telefone, seja por WhatsApp, seja por redes sociais; que prevê uma pena de um até seis meses; que é elaborado TCO e é julgado no Juizado Especial também. Então, esses são os mais comuns, publicação de fotos denegrindo sua imagem que acabam incidindo em crimes cibernéticos.
7LN: Somente o autor é punido ou também há penalidades para quem compartilha, comenta ou faz download do material?
Juarez Ferreira: Inicialmente pune-se o autor por ele estar fazendo, mas as pessoas que têm o conhecimento de que aquele fato não é verídico e dá publicidade, elas também são penalizadas.
7LN: Quando se popularizaram, as redes sociais eram consideradas “terra de ninguém”, mas hoje o Código Processual Penal já orienta a aplicação de punições a quem comete crimes contra a honra. Qual é a importância dessa mudança nos últimos tempos?
Juarez Ferreira: A pessoa acha que a internet, por ser anonimato, ela pode fazer o que ela quiser. Nós temos alguns marcos reguladores. Nós tivemos em 2014 o Marco da Internet que é a Lei 12.965, em que regula a parte cível. Ela determina o que tem que fazer. E temos também, no finalzinho de 2012, que foi até popularmente conhecida como Lei Carolina Dieckmann, que é a lei que definiu mudanças no Código Penal, alterou algumas punições. E aliado a isso, qualquer ilícito penal, mesmo sendo praticado pela internet, ele pode ser adaptado ao Código Penal porque é uma gama de delitos (é estelionato, ameaça, falsificação de identidade falsificação ideológicas, vários crimes) que enquadram no Código Penal estão ali, e outros na área Cível, que podem entrar com ação indenizatória contra a pessoa que motivou aquela publicação na internet.
7LN: Porque ainda é difícil identificar autores de crimes contra a honra no ambiente virtual?
Juarez Ferreira: Não só no ambiente virtual como também no ambiente comum, porque eu preciso hoje de uma autorização judicial. A partir do fato delituoso que a pessoa é vítima, ela procura uma delegacia, seja a local ou especializada em Belo Horizonte. Que pese às delegacias cibernéticas terem a competência originária, as delegacias locais podem iniciar o procedimento. A partir daí o delegado tem que solicitar ao juiz, que vai abrir ficha no Ministério Público para quebra de sigilo do IP daquele computador que foi usado para cometer o crime. Então, isso demora um pouco mais. Tem que ir para justiça, o juiz tem que liberar, tem que ser oficial para essa quebra de sigilo e a partir daí o procedimento corre. Nosso problema é a legislação, que não dá a atribuição ao delegado de agir de pronto. Ele deve ter uma peça motivo, apresentar à Justiça, pegar a autorização oficial e, então, a gente consegue a quebra do sigilo do IP para localizar aquela pessoa.
7LN: A quem deve ser feita a denúncia?
Juarez Ferreira: O que nós recomendamos é que a pessoa faça um print daquela tela ou imprima e procure fazer uma ocorrência policial o mais rápido possível. Ela deve procurar a Polícia Militar ou qualquer unidade da Polícia Civil, estão todas habilitadas a fazer o Reds. A partir do Reds vai ser encaminhado para as delegacias competentes. Aqui em Sete Lagoas, como os delitos são de menor potencial ofensivo, a pena varia de três meses a 2 anos. Normalmente, a delegada responsável pelo Juizado Especial daqui é quem vai fazer esse procedimento. Se for um caso de maior complexidade é encaminhado para a Delegacia Especializada de Crimes Cibernéticos. Tivemos dois casos grandes aqui envolvendo a Prefeitura e o deputado Douglas Melo. Nós solicitamos o apoio da especializada, porque foi um contexto maior. Foge da nossa capacidade de equipamentos para atuar e pedimos o apoio da especializada para ambos os casos.
7LN: Qual é o perfil da pessoa que comete esse tipo de crime?
Juarez Ferreira: Aqui em Sete Lagoas ainda não temos esse tipo de matéria específica, para esse trabalho em geral, ainda não. Mas no crime político, geralmente, é aquela candidatura acirrada. A pessoa achando que vai ganhar um pouco mais de voto, denegrindo a imagem do outro candidato.
7LN: E em relação aos crimes contra a honra fora do contexto de Sete Lagoas e do meio político?
Juarez Ferreira: Ainda não conseguimos fazer essa avaliação, porque é um mundo muito amplo para se fazer uma matéria específica: a pessoa que tem essa personalidade comete esse tipo de crime. É muito complicado fazer essa identificação individualmente.
7LN: Neste ano teremos eleições, em um ambiente político cada vez mais hostil. Como será o trabalho da Polícia Civil para coibir os crimes contra a honra e as fake news?
Juarez Ferreira: Em primeiro lugar, a pessoa tem que entender que o próprio fato de ela criar um perfil falso na internet, se ela utilizar a identidade de uma outra pessoa, ela já está cometendo um crime de falsa identidade, que tem pena de detenção de três meses a um ano e multa. O que nós estamos orientando, e que a própria Justiça Eleitoral já faz, isso através de sua comunicação, é que a comunicação falsa e emissão é crime e nós vamos utilizar a imprensa para dar essa publicidade. A pessoa, tanto de cometer o fato de produzir quanto de dar publicidade a um fato irreal, ela está cometendo crime. Queremos conscientizar o cidadão. Se você não tem ciência daquela informação que você recebeu, não transmita. Você pode, amanhã, ser penalizado também. Então procure saber se aquela matéria é verídica, antes de passar para os seus colegas de grupo.
7LN: Há quase um ano atrás o senhor nos reportou a necessidade de pulverizar departamentos especializadas em crimes cibernéticos nas delegacias regionais, para tirar a sobrecarga do departamento de Belo Horizonte. Como está essa situação atualmente?
Juarez Ferreira: O governador de Minas tem se sensibilizado e a partir de agora, 2018, com o incremento das novas turmas de investigadores, nós temos quase 600 investigadores se formando, e a abertura do concurso para delegado, em torno de 76 vagas. E nós temos possibilidade de reestruturar os departamentos do interior. Nós temos uma defasagem de pessoal chegando na casa de quase 50%. Então, só a partir de novos concursos que vai ter a possibilidade de ter essa estruturação aí.
7LN: Quer acrescentar algo?
Juarez Ferreira: Como sempre é deixar para a comunidade que a Polícia Civil está à disposição de toda comunidade de Sete Lagoas e região. E pedindo que a população seja parceira, que ela utilize os meios de denúncia (181 Disque Denúncia), não são identificadas e com isso possibilitar o nosso trabalho.
Por Ana Amélia Maciel
Sete Lagoas Notícias